A renúncia do Papa Bento XVI

Assim que soube do comunicado de renúncia do Santo Padre o Papa Bento XVI, vieram-me duas palavras ao coração: coragem e humildade.
Vejo o Papa como um homem corajoso e humilde diante desse ato.
Como sabemos, o cristianismo prega a eternidade, o "para-sempre", o comprometer a vida toda, até a morte.
Vejam-se, por exemplo, o matrimônio e o sacerdócio cristãos. Quando alguém deixa de ser padre ? Quando morre, pois no Céu não há sacerdotes, a não ser Jesus Cristo, o Sumo Sacerdote (cf. Hb 4, 14). Quando alguém deixa de ser casado ? Quando morre ou quando seu cônjuge falece (cf. Mt 19, 6).
É óbvio que a renúncia papal está prevista no Direito Canônico, portanto não há irregularidades neste caso, mas, como sabido, não é usual, não é comum. Houve poucas durante toda a história da Igreja, que está acostumada a ver os papas serem sucedidos após sua morte e não em vida, como deverá ocorrer com Bento XVI.
Por isto, é muito corajoso um Papa que renuncia, mesmo havendo previsão jurídico-canônica, haja vista tal ato não ser comum.
Porém, a coragem dessa atitude não se restringe à falta de usualidade da renúncia, mas sobretudo naquilo que ela profundamente guarda: É um ato de um homem que, conhecendo-se à luz de Deus, percebe seus limites, é sabedor de sua verdade, e enfrenta o orgulho mascarado de vergonha, a qual sempre tenta proteger a autoimagem. Não, o Papa Bento XVI não se preocupou com sua autoimagem, como vários líderes religiosos. Não se deixou dominar por aquela pergunta orgulhosa do ego: "O que vão pensar de mim, o que vão falar de mim ?" Foi além do orgulho, enfrentou-o! Fez o que discerniu ser certo, como ele mesmo disse no seu discurso de anúncio da renúncia:
"Após ter repetidamente examinado minha consciência perante Deus, eu tive certeza de que minhas forças, devido à avançada idade, não são mais apropriadas para o adequado exercício do ministério de Pedro".
Que coragem de um homem que não teme as "certezas" dos outros, mas age segundo sua consciência perante Deus.
Que humildade de um homem que não esconde seus limites ou tenta disfarçá-los para manter uma pseudo-imagem diante dos outros!
Que coragem de um Papa que mostra a mim e a você que não há problema algum em ser humano, em admitir a humanidade, isto é, quem realmente somos. Que sabe que ser homem ou mulher, com tudo o que isto comporta: virtudes, dons, limites, fraquezas, não se contrapõe ao chamado à santidade, pois Deus nos chama à santidade como somos: homens e mulheres na família, no trabalho, com dons e limites. Ele não nos chama a sermos primeiramente anjos para depois sermos santos. Não!
Um Papa que renuncia ao papado, ao ministério de Pedro, como ele próprio disse, aponta para uma liberdade interior tremenda, para uma plena consciência do amor que Deus tem por ele.
Joseph (José, o primeiro nome do Papa) sabe-se plenamente amado por Deus, tem consciência de que Deus não vai deixá-lo de amá-lo um "milímetro" sequer por causa de sua renúncia. Não é daquelas tristes e escravas pessoas que acham que Deus só as ama se continuam em certas atividades, em compromissos comunitários. "Se faço, se cumpro, se obedeço, Deus me ama e me salvará, não irei para o inferno". Tadinhos(as)! Não entenderam, porque não experimentaram verdadeiramente, o Amor de Deus. Acham que Deus os ama a partir do que fazem e não simplesmente por quem são: filhos de Deus!
Como este exemplo do Vigário de Cristo na Terra será fundamental para as Novas Comunidades, que teimam em pregar coisas do tipo: "Pois é, saiu da Comunidade, não será plenamente feliz. A única via para a santidade é a Comunidade".
Conheço tanta gente profundamente infeliz em vida comunitária, vivendo uma máscara, uma "capa", dizendo que ama a Deus por cumprir regras, mas odiando o próximo mais próximo (cf. I Jo 4, 20).
E conheço muito mais pessoas, inclusive "autoridades", que pregam o medo, o terror, para que os outros nem sequer se questionem se devem permanecer ou não na Comunidade, se foram chamadas por Deus apenas por um determinado tempo, para viver uma missão por certo período de suas vidas, como é o caso de nosso querido Papa Bento XVI.
Sim, há chamados temporários também, não somente os "para-sempre" do matrimônio e do sacerdócio. Às vezes, Deus, em seu amor, quer realizar uma maravilhosa obra valendo-se de certo tempo na vida de alguém, e isto é belo, é grande, é extraordinário. Basta que cada um, como o Papa, perceba-se à luz de Deus e não entre em crise porque outros afirmam o contrário.
Aliás, no início da minha caminhada, aprendi algo muito verdadeiro com uma jovem formadora: "Deus não manda recado, fala pessoalmente a você!"
Assim ele fez com seu filho Joseph (o Papa).
Que Deus o continue abençoando, Papa Bento XVI, homem corajoso e humilde!
Deus abençoe você também!
Álvaro Amorim.
 
Nas citações desta obra ou de parte dela, inclua obrigatoriamente:
Autor: Álvaro Amorim, em http://anunciodaverdade.blogspot.com

4 Comentários:

MARIA EDI comentou:

Olá Álvaro, bom dia!! Gostei muito do seu artigo e para mim veio ainda mais regado com um "sinal de Deus" sobre algo que tem "prescutado" o meu coração e a minha alma. Deus o abençoe!!! Abraços, Edianez.

Blog comentou:

O artigo tem pontos muitos bons sobre a liberdade interior, a coragem e a humildade.

Mas com as seguintes ressalvas da minha parte, de algumas ideias que ficaram meio mal definidas.

Dentro da Igreja a vocação é algo que se traz dentro de si, não é um trabalho ou algo que se tem que fazer.

O papado é uma missão e pode ser renunciada. É licito. Nesse caso especial é um ato belo de um homem que reconhece a própria fraqueza e nos dá uma lição de humildade e pobreza.

Em compensação, renunciar uma vocação é algo muito, muito triste! É como um padre que abandona o sacerdócio. Ou alguém que sabe que tem um chamado especial, um religioso ou um consagrado e decide que não quer mais vivê-lo(sê-lo).

Para aqueles que não são vocacionados à Comunidade (e aqui me refiro a aquelas comunidades com carismas particulares), quanto mais cedo for discernida a falta de carisma e pacífica for a saída, melhor. Menos sofrimento pra todos.

Para aqueles que trazem em si o chamado de Deus a aquela vocação específica, que morram lutando para serem fieis! Eu sou a minha vocação, e minhas limitações não desfazem o que eu sou.

Pois se existe no homem a certeza do chamado. E isso vai além do que o próprio homem consegue entender ou expressar. Fugir do chamado (de Deus), é fugir do próprio Deus.

Anúncio da Verdade comentou:

Cara Edianez,
Alegro-me por Deus ter utilizado este artigo para o seu bem. Ele sempre opera maravilhas em nós!
Deus a abençoe sempre!
Álvaro Amorim.

Anúncio da Verdade comentou:

Caro(a) irmão(ã) assinado(a) como "Blog",
O chamado a ser papa é uma vocação (do latim, vocare, chamado). É Deus quem chama um homem a ser Vigário de Cristo na Terra, por meio da eleição no conclave.
Portanto, como há a possibilidade de renúncia, essa vocação é temporária, como existem vocações temporárias no que se costuma chamar Novas Comunidades, diferentemente dos chamados ao sacerdócio e ao matrimônio.
O fato de alguém "sair" de uma dessas "comunidades", especialmente por perceber que fora um tempo de Deus em sua vida, assemelha-se à atitude do Papa Bento XVI, pois revela autoconhecimento e coragem na decisão.
Do que nunca poderemos "sair", meu(minha) caro(a), é da filiação divina. Isto é indelével, característica do nosso batismo.
Aliás, o que se chama "vocação" nas Novas Comunidades é na verdade uma maneira de se viver a única vocação de filhos de Deus, uma forma de viver o batismo. Em última instância, vocação mesmo, neste sentido de consagração a Deus, só a do batismo.
Como você deve saber, não há dois batismos, logo não há, no sentido dessa consagração, duas vocações (cf. Ef 4, 4-6).
Mais ainda: Em se tratando do padre, a própria Igreja, por vezes, concede licença para afastamento total, como foi o caso do Padre Dalcides (aquele que tinha um programa na Canção Nova), que recebeu autorização para casar e casou.
O importante é estar no chamado de Deus, é conhecê-lo e vivê-lo, sem medo, lançando fora todo o temor (cf. I Jo 4, 18).
Deus o(a) faça livre!
Álvaro Amorim.

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