Deus nos fala de várias maneiras. Às vezes, das mais incomuns.
Lembro-me de uma dessas maneiras insólitas em que Deus me falou.
Foi durante um curso de atualização jurídica, quando um colega meu aproximou-se de mim, certo dia, e pediu-me a indicação de um livro que fosse como que uma biografia de Jesus Cristo. Ele disse que era agnóstico, que já lera algo do Budismo, do Espiritismo, de algumas religiões, e estava com vontade de ler uma biografia de Cristo.
Nessa época, o Papa Bento XVI ainda não tinha escrito Jesus de Nazaré. Eu então parei um pouco e, em silêncio, pedi ajuda urgente ao Espírito Santo. Disse ao colega que a melhor biografia de Cristo eram os Evangelhos. Ele disse-me que já havia lido um pouco, mas queria um livro sem ser a Bíblia. Fiquei de indicar-lhe alguns livros no dia seguinte.
Fui para casa, liguei para as principais livrarias católicas de Fortaleza, pesquisei na Internet e fiz uma relação de seis livros, em ordem decrescente de acordo com o desejo do colega.
Entreguei-lhe a relação de livros no dia seguinte, com os respectivos preços e os telefones das livrarias.
Ele me agradeceu muito, ficou até surpreso com a pesquisa minuciosa que eu havia feito e disse-me que no sábado iria comprar um dos livros.
Percebi aí o início da grande obra atrativa que Deus iniciara em seu coração. Também uma grande oportunidade para eu convidá-lo a conhecer Cristo de verdade, a encontrar-se com ele, a ter uma experiência com o Ressuscitado, o que aconteceria em breve.
Mas eu não percebera que a obra maior estava para começar em mim.
Um dos livros que compuseram a relação, o sexto que o indiquei, fora-me sugerido pelo Carmadélio, quando eu lhe contei o pedido do colega. O Carmadélio disse-me que esse livro não era uma biografia de Cristo, mas que respondia questões que muitos fazem sobre o Cristianismo e a Igreja Católica hoje, no século XXI, e que, portanto, falava de Cristo, é óbvio! Resolvi pô-lo no fim da lista, pois procurei encabeçar a lista com os livros mais biográficos mesmo. No final da lista estava o livro indicado pelo Carmadélio: “O Sal da Terra”, publicado em 1996, escrito “simplesmente” pelo então Cardeal Joseph Ratzinger, hoje nosso Papa Bento XVI.
Não tive conversa: comprei o livro e comecei a “devorá-lo”, e cada vez que o lia, mais o Senhor lançava em mim a luz da Verdade que pacificava meu coração, antes tão cheio de dúvidas, questionamentos, sobre tudo, pois eu estava passando por um período muito difícil, deparando-me com as “mentiras” na minha vida e na vida de alguns irmãos; estava necessitado, sedento da Verdade.
Através da leitura desse livro, ouso dizer que percebi alguns dos motivos que fizeram o Espírito Santo guiar os cardeais à eleição de Joseph Ratzinger como Papa. Vi um homem simples, amável, apoiado na Verdade, respondendo às perguntas de Peter Seewald, um jornalista alemão que deixara a Igreja na década de 70. Com as respostas do Cardeal ao jornalista alemão, o próprio Espírito Santo colocava fim em terríveis dúvidas minhas e libertava-me com a Verdade.
Partilho aqui algumas questões tratadas pelo jornalista e respondidas pelo então Cardeal Joseph Ratzinger. Procurei extrair o essencial das respostas. O interessante é ler o livro todo, é claro.
A FÉ
Seewald: A verdade sobre o Homem e Deus parece ser muitas vezes triste e pesada. A fé, em si, só é suportável por naturezas mais fortes ? Muitas vezes é tida como uma exigência demasiado grande. Como poderemos alegrar-nos com a fé ?
Cardeal Ratzinger: Eu diria, pelo contrário, que a fé dá alegria. Se Deus não está presente, o mundo desertifica-se e tudo se torna aborrecido, tudo é completamente insuficiente. Hoje vê-se bem como um mundo sem Deus se desgasta cada vez mais, como se tornou um mundo sem nenhuma alegria. A grande alegria vem do fato de existir o grande amor, e é essa a afirmação essencial da fé. Você é alguém indefectivelmente amado. Foi por isso que o Cristianismo encontrou sua primeira expansão sobretudo entre os fracos e os que sofriam.
AS DÚVIDAS
Seewald: Os católicos podem ter dúvidas, ou são hipócritas e hereges quando as têm ? O que parece estranho nos cristãos é que façam uma distinção entre verdade religiosa e verdade científica. Ocupam-se de Darwin e vão à igreja. É possível tal separação ? Só pode haver uma verdade: ou o mundo foi realmente criado em seis dias ou se desenvolveu em milhões de anos.
Cardeal Ratzinger: Num mundo tão confuso como o nosso, a dúvida voltará sempre, inevitavelmente, a invadir cada pessoa. A dúvida não tem de estar automaticamente ligada a uma renegação da fé. Posso confrontar-me seriamente com as questões que me inquietam, e confiar em Deus, no núcleo essencial da fé. Por um lado, posso tentar resolver as contradições aparentes, mas, por outro, apesar de não poder encontrar soluções para tudo, posso confiar em que se possa resolver o que eu não posso solucionar. Também na história da teologia volta sempre a haver questões que, no momento, não podem ser resolvidas, que não se devem pôr de parte com interpretações forçadas.
Também faz parte da fé a paciência do tempo. O tema a que acabou de se referir — Darwin, a criação, a teoria da evolução — é um tema de um diálogo que ainda não está concluído e que, no momento, provavelmente não poderá ser concluído com os meios de que dispomos. O problema dos seis dias não se põe com particular agudeza entre a posição da ciência moderna sobre a origem do mundo e a fé. Porque também na Bíblia é claro que é um esquema teológico, que não pretende simplesmente narrar a história da criação. No próprio Antigo Testamento existem outras representações da criação. No livro de Jó e nos livros sapienciais encontramos relatos da criação que tornam claro que os crentes, mesmo nessa ocasião, também não pensavam que nesses textos o processo da criação estava, por assim dizer, fotograficamente representado. Só está representado na medida em que nos permite apreender o essencial: que o mundo provém do poder de Deus e é criado por ele. Como os processos depois se desenvolveram é uma questão completamente diferente, em que até a própria Bíblia deixa uma grande abertura. Por outro lado, penso que a teoria da evolução ainda não ultrapassou, em grande parte, o campo das hipóteses, e que, muitas vezes, está misturada com filosofias quase míticas, sobre as quais ainda tem de haver diálogos críticos.
OS DISCERNIMENTOS
Seewald: Que importância tem a inspiração para o senhor e, sobretudo, como é que se tem inspiração ?
Cardeal Ratzinger: Elas não podem ser provocadas, têm de surgir. Mas também é preciso ser prudente perante elas, têm de ser verificáveis na lógica do conjunto. De resto, a condição para uma “inspiração” é que não se esteja num estado febril, que se possa refletir calmamente e deixar amadurecer o pensamento bastante tempo dentro de si.
A PREGAÇÃO/EVANGELIZAÇÃO
Seewald: É necessário um modo diferente de transmitir a fé ?
Cardeal Ratzinger: Penso que sim, porque o fato de haver tanto cansaço entre os cristãos, pelo menos na Europa, mostra que é preciso transmitir a fé de outra maneira. Li a história de um padre ortodoxo que disse: “Esforcei-me tanto, mas as pessoas não me ouvem, adormecem ou não vêm. É porque o anúncio não é bem feito.” Isso é um exemplo para as experiências que também os outros fazem. O que é importante é que o pregador tenha uma relação interior com a Sagrada Escritura, com Cristo, a partir da Palavra viva, e que, como Homem desta época em que vive e que é a sua, à qual não foge, realmente interiorize a fé. E depois, quando realmente puder comunicá-la a partir de um aprofundamento pessoal, o modo diferente de a comunicar vem por si mesmo.
A BUROCRACIA
Seewald: O mundo da Igreja de hoje é burocrático, temeroso e humanamente planejado. Precisa outra vez de um pensamento mais intuitivo contra a acentuação excessiva da razão ? Trata-se de compensar uma falta de contemplação e a negligência dos valores espirituais, praticada durante muito tempo ? O antigo arcebispo de Paris, o Cardeal Veuillot, disse uma vez: “Tudo tem de ser puro — puro, puro, puro. Do que precisamos é de uma verdadeira revolução espiritual.” E não é verdade que a Igreja só poderá voltar a ter uma nova descendência se for realmente pura, virginal ?
Cardeal Ratzinger: De algum modo, a sua pergunta já é uma resposta. Eu disse muitas vezes que penso que temos burocracia demais. Em todo caso, serão necessárias simplificações. Os assuntos não devem passar todos por grêmios, tem de haver sempre o encontro pessoal. E também não se pode dominar tudo racionalmente. Por muito que o Cristianismo reclame a razão e queira dialogar com ela, há muitas outras dimensões da apreensão da realidade das quais também precisamos. Acabamos de falar do diálogo entre as religiões e da mística — e essa dimensão do recolhimento, da interioridade recolhida, tornou-se particularmente necessária num mundo febril. Há uma expressão conhecida de Karl Rahner: “O cristão do futuro será um místico ou não será.”
OS NOVOS SANTOS
Seewald: Há alguns anos o senhor manifestou a esperança de que se delineia algo como uma “hora pentecostal na Igreja”. Referiu-se a grupos de jovens inteiramente decididos por toda a fé da Igreja, pela “catolicidade plena e indivisa”. São precisos novos cristãos que sejam, outra vez, mais corajosos, mais orgulhosos ? Uma ocasião o senhor afirmou que a Igreja hoje não precisa de novos reformadores, mas sim de novos santos que vêm da vitalidade interior da própria fé e que, por isso, descobrem de novo a riqueza da fé e o fato de esta ser indispensável.
Cardeal Ratzinger: Retomando primeiro os termos reformador/santo: cada santo é um reformador, na medida em que dá nova vitalidade à Igreja e também a purifica. Mas por reformadores entendem-se, normalmente, pessoas que tomam medidas estruturais e que se movem, por assim dizer, no domínio das estruturas. E nesse caso eu diria que desses, na realidade, não precisamos tanto nesta altura. Do que precisamos realmente é de pessoas que tenham interiorizado o Cristianismo, que o vivam com felicidade e como esperança e que, assim, se tenham tornado pessoas que amam; é o que chamamos santos.
A VONTADE DE DEUS
Seewald: O que Deus realmente quer de nós ?
Cardeal Ratzinger: Quer que nos tornemos pessoas que amam, porque então somos imagens dele. Porque ele é, como nos diz São João, o amor, e quer que haja criaturas que sejam semelhantes a ele; criaturas que, a partir da liberdade do seu amor, se tornem como ele e lhe pertençam e, desse modo, irradiem, por assim dizer, a luz dele mesmo.
Peço a Cristo que as palavras do seu atual Vigário, o Santo Padre, o Papa Bento XVI, nos levem a ser verdadeiros cristãos: levem-nos a amar, simplesmente!
Shalom!
Álvaro Amorim.
Consagrado na Comunidade Católica Shalom.
2 Comentários:
António de Oliveira Mota Filho
Gostei muito deste fragmento do livro do Papa Bento,
Quando ele nem era papa, ainda. Fiquei curioso para ler
mais. Vou tentar adquirir este livro. Gosto muito de escutar o programa anúncio da verdade.
Acredite! Espere! Sempre haverá uma saída, sempre brilhará uma estrela. E essa estrela é o programa anuncio da verdade onde você vai encontrar o verdadeiro lugar onde fala de Deus e Deus é a nossa saída a sua esperança e o meu viver.Obrigada a toda comunidade Shalom,amo todos vocês fique com Deus,um beijo no seu coração. Shalom Maria Auxiliadora Rabelo
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